Muitos dos livros e contos que tenho lido
ultimamente pecam no quesito diálogo. A primeira vista parece ser algo fácil de
criar, mas não é. Diálogos são perniciosos se mal utilizados e devemos construí-los
com cuidado. Praticamente, desenhá-los.
Há quem acredite que diálogo é uma simples
conversação, por mais que deva parecer uma, o diálogo é muito mais que um
descomplicado bate papo. Trata-se de uma ferramenta narrativa onde o escritor
faz a história andar, revela características dos personagens ou fornece
informações do enredo como um todo.
Ao se mover a narrativa com o diálogo, o escritor
deve criar eventos significativos dentro da fala dos personagens. Quatro assaltantes
de banco podem conversar sobre como será o próximo golpe deles. Deixando claro
para o leitor para onde a história irá.
Os diálogos devem ter conflitos e tensão. No exemplo
anterior, podemos aproveitar o diálogo entre os bandidos para mostrar qual
deles é o líder, quem entre eles pode desafiar a liderança já estabelecida e
quais são simples capangas que obedecem a ordens.
Enquanto os quatro discutem sobre o assalto, o
escritor demonstra, através da forma de falar e de algumas ações, quem tem
tendência a ser violento, quem pode resolver problemas através da lábia e quem
não tem nenhuma habilidade especial. Tudo isso pode ser mostrado desde a forma
com que o personagem fala, o domínio da língua que ele possui e das ações que
realiza diante dos outros.
Um simples assaltante de banco do interior usará
várias gírias e não se importará com todos os detalhes, enquanto um líder de
quadrilha que pretende assaltar o maior banco do país teria estudado todo o
sistema de segurança, possíveis rota de fuga, contingente de seguranças que guardam
o local. Se for um gênio do crime, buscará fazer tudo isso sem dar chances de
ser capturado.
O grande desafio do diálogo é fazer tudo o descrito
anteriormente de forma natural e respeitando o meio termo entre falas e
descrição. Duas pessoas conversando sem agir parecem cabeças falantes, enquanto
um diálogo com travessões e personagens se movendo a cada nova linha, fica
chato e cansativo.
O diálogo tende a dar ritmo à obra, ou deveria ser
assim, já que permite diminuir as descrições e renova o fôlego do leitor. Eis aqui
o maior incômodo que tenho visto nas minhas leituras, principalmente dos
iniciantes.
Se quatro bandidos estão discutindo sobre como será
o próximo assalto, o que me interessa é o assalto em si. Não me importa se um
deles deixou o cigarro sobre a mesa, coçou a cabeça, pigarreou, olhou para o
lado, olhou as horas no celular, ou ficou observando os lados. Pelo menos não
me importa se ele fizer isso a toda hora. O diálogo ficará travado, já que o
interessante é saber qual o banco irão assaltar, que dia, que horas, como
farão. Terá uso de armamento pesado? Usarão reféns? Chegarão atirando como
loucos ou vão sequestrar o gerente e obrigá-lo a abrir o cofre?
Falando de forma simplória, o líder perspicaz pode insistir
em uma abordagem sem violência para facilitar o andamento do assalto, enquanto
o capanga troglodita insiste que chegar atirando é a forma correta de garantir
o sucesso da empreitada. Ambos argumentam por algumas linhas e então se movem.
Quem se levantar da mesa primeiro, demonstrará ter
perdido a paciência, ou um soco fazendo as plantas do banco tremerem sobre a
mesa, terá esse efeito. Aí sim a descrição e ação serão bem recebidas pelo
leitor.
Continuando com exemplo simples. Se o capanga é quem
perde a razão, você deverá mostrar a reação do líder e as consequências. Se ele
for um psicopata que não aceita que discordem do plano, pode matar o capanga
ali mesmo, sem hesitar. Caso seja um líder que não precisa de violência a todo
instante e ninguém tem coragem de discordar dele por muito tempo, a simples
descrição de que o chefe se calou e encarou o capanga, fará com que todos parem
de argumentar e ouçam as ordens.
Deixei o último parágrafo em aberto por gosto,
espero que o segundo caso tenha te incomodado um pouco. Explico o motivo: no exemplo anterior eu
disse que o capanga se levantaria da mesa, se for um líder com poder absoluto e
que não precisa ficar repetindo as ordens, nenhum capanga se levantará ou
esmurrará a mesa na frente dele. Escrever diálogos não é simplesmente colocar
pessoas conversando. Todas as atitudes devem ser observadas para que sejam
condizentes com a personalidade e respeitem o padrão de comportamento dentro
dos grupos.
Resumindo, o diálogo é uma ferramenta que auxilia o
escritor em diversas áreas, mas não deve ser construído de qualquer forma. Deve-se
planejar o que se quer com aquele diálogo: demonstrar características do personagem,
explicar acontecimentos anteriores, mostrar possíveis ações futuras, entre
outras possibilidades. Mas o diálogo não deve ser somente pessoas conversando
banalidades.
Não pretendi discorrer sobre todos os detalhes que
envolvem a construção de diálogos, podem comentar sobre aspectos que achem
importantes e que eu não falei por aqui.
Muito bom artigo, existem muitas construções de diálogos muito ruins por ai.
ResponderExcluirObrigado
ExcluirNa moral, esse post só não é melhor porque não é maior.
ResponderExcluirMandou ver Saulo.
O diálogo é muito mais que simples falas e não só pode como deve denunciar características tanto dos personagens, como do cenário ou da trama.
Se não for pra ser assim, melhor nem ter.
Obrigado Brendo, não gosto de criar posts grandes demais, mas não significa que não possamos retomar o assunto em novas postagens.
ExcluirIsso mesmo. Também abomino diálogos desnecessários.
ResponderExcluirÓtimo artigo. Acabei de conhecer seu blog através da sua parceria com "O Leitura Descontrolada". Seus livros parecem muito bons, desejo sucesso!
Meu blog: "Fala C. R!"
Obrigado. Pode passar por aqui mais vezes.
ExcluirSucesso para ti.
Muito bom Saulo, um ótimo artigo.
ResponderExcluirVlw, Kaue
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